Por Paulo Cezar da Silva, no Blog da Priscila Ace
Prezada Priscila
Com relação ao Diflubenzuron, primeiramente quero parabenizá-la pela
sua conduta de apenas trazer relatos e não apresentar de forma nenhuma,
informações tendenciosas que contribuam para disseminar o pânico e o
desassossego, e também pelas centenas de “seguidores” do seu Blog.
Permita-me a comentar seu artigo sobre o Diflubenzuron, e minha
intenção é apenas, esclarecer os fatos à luz da realidade cientifica
atual, no que diz respeito ao produto, pois sou técnico do Programa
Nacional de Controle da Dengue do Ministério da Saúde.
Com relação às informações postadas sobre o Diflubenzuron em outros
Blogs, existem fatos que vou tentar esclarecer. Vamos primeiro comentar
sobre o “link” postado que no Blog do Carlos Simas (e que tem sido
visitado por centenas de ACE/ACS) onde se refere como “nota técnica” da
Anvisa, mas na realidade, é apenas uma apresentação (Power Point)
feita por técnico da órgão regulador em uma Oficina promovida pela
SES/RJ para, a princípio, tratar da indicação do uso de EPI aos ACE no
âmbito do Rio de Janeiro, da qual participei
Em decorrência do posicionamento da Anvisa , que informou na ocasião
que estava em andamento uma revisão da Categoria toxicológica do
Diflubenzuron passando da Categoria IV (pouco toxico) para a Categoria
II (medianamente toxico, e não altamente tóxico como referido no Blog),
os dirigentes da Secretaria de Vigilância em Saúde, convocaram logo
após, uma audiência com o Presidente da Anvisa, Dr Dirceu Raposo de
Melo, que após as discussões, informou o seguinte em ata assinada pelos
participantes:
“Esclareceu-se que o DIFLUBENZURON (Agente larvicida) pode ser
utilizado, e que o que se está discutindo, é a proteção do trabalhador
(EPI) que vai manipular e pulverizar o produto.
A reavaliação do produto formulado não se dará imediatamente, porém é
sabido que o produto formulado é de nível 4 (quatro) e deverá permanecer
como tal; a reavaliação trata do produto para uso agrícola e não em
saúde pública (no combate à dengue).
O produto formulado classificado como nível 4 é de conhecida segurança
quando utilizado dentro dos padrões e indicações preconizadas e com a
devida proteção dos trabalhadores”
Esta ata é inclusive, assinada pelo autor da apresentação referida como “nota técnica”.
É necessário entender que, não se compara a exposição do aplicador nas
atividades agrícolas, com a exposição que poderia ocorrer decorrente do
seu uso em saúde pública. Nota-se que a mudança se dará para
formulações de uso agrícola pelo fato de alguma evidencia de irritação
ocular.
Um fato que deve ser esclarecido, é que, TODOS OS INSETICIDAS
UTILIZADOS EM SAÚDE PUBLICA SÃO PRODUTOS DE USO AGRÍCOLA, pois não
existe interesse por parte dos laboratórios produtores, em desenvolver
produto específico para esta finalidade. Este é o motivo da embalagem
trazer informações sobre agricultura e não sobre saúde pública.
Os inseticidas adquiridos pelo Ministério da Saúde para distribuição
aos municípios por intermédio das Secretarias Estaduais de Saúde, são
necessariamente, preconizados pela OMS pelo WHOPES – WHO Pesticide
Evaluation Schemme.
Todos ingredientes ativos, antes de serem indicados, passam por uma
completa revisão da literatura cientifica, onde se analisará todos
trabalhos disponíveis até a data da avaliação.
Periodicamente a OMS submete estes produtos a uma revisão rotativa da
literatura (Rolling revision), de maneira que sempre, estão sendo
avaliados. Este fato agrega segurança nestas indicações, pois temos
certeza que especialistas estão sempre atentos ao que pode aparecer de
novidade sobre o produto. O Diflubenzuron passou por este processo
antes de ser liberado pela OMS para uso em saúde pública.
Com relação aos produtos que serão utilizados em água de consumo humano,
os protocolos de segurança são ainda mais rígidos, e ocorrem no âmbito
do Programa Internacional de Segurança Química – IPCS, entidade máxima
que trata de assuntos relacionados à segurança de substâncias
químicas. O IPCS é vinculado à OMS, à UNEP (Organização das Nações
Unidas para o Meio Ambiente) e à OIT (Organização Internacional do
Trabalho).
As liberações de produto para uso em saúde pública em água de consumo
humano são coordenados no IPCS pelo GDWQ (Guidelines Drinking Water
Quality), sendo que, até o momento 5 substâncias são utilizadas para uso
em água potável: (i) temefós, (ii) Bti, (iii) diflubenzuron, (iv)
novaluron, (v) piriproxifen. Mais recentemente foi liberado o Spinosad
que tem mostrado excelente atividade larvária contra o Aedes aegypti e
integrará as opções de controle no Brasil.
Vejam quantas substâncias podem ser utilizadas, e que, se não se
repassar informações seguras e corretas à população, somos responsáveis
pela disseminação da insegurança, incerteza, desassossego e pânico aos
usuários e à população.
Devemos acreditar que as referencias (OMS, IPCS, FAO etc.) são sérias e
confiáveis, e senão agirmos assim voltaremos à idade das trevas, não
confiando mais em nada que se diga.
Em documento oficial a OMS assim se refere: “Algumas substâncias são
utilizadas em água potável para controle de vetores. É conveniente que
não se criem diretrizes restritoras que impeçam o seu uso. Deve-se
buscar um equilíbrio entre a qualidade da água e a necessidade de
controlar vetores. Entretanto é conveniente que as doses sejam as
menores possíveis”.
Esta informação é bastante sóbria e direta e passa o recado: o risco
existe, e necessita-se de tratar este tipo de água – não atrapalhem.
Lembrem-se o produto é de Categoria IV (DL50 = 4.600 mg/Kg PV), sendo então do grupo das substâncias pouco tóxicas.
O fato que deve ser entendido é que um dos produtos da quebra da
molécula do BPU é um precursor da 4-cloro-anilina que tem ação
meta-hemoglobinizante (formação de meta-Hb). É necessário informar que
ao nosso redor estamos diária e diretamente em contato com centenas de
outras substâncias com o mesmo efeito, como por exemplo: anilinas e
corantes diversos, pigmentos azoicos (tingimento de jeans), tintas
gráficas, medicamento como primaquina, cloroquina, plasil, nitritos e
nitratos (mortadela, salames), e pasmem: alguns legumes vermelhos.
Os procuradores do apocalipse, de maneira intencional ou não, colocam
uma lupa de aumento apenas em cima do BPU e não citam, ou não sabem,
do fato de que inúmeras outras substâncias possuem o mesmo efeito.
Não vamos aqui, relatar as fontes, pois seria muito extenso, mas deve-se
acessar o site da OMS e IPCS para buscar estas referencias, mas o PBU
não tem ação, carcinogênica, teratogênica, mutagênica enfim, nada se
comprova com relação a isso. Caso houvesse alguma dessas evidências, o
produto não teria sido autorizado pela OMS/IPCS para uso em água
potável.
Caso seja necessário, posso repassar estas referencias.
No caso específico do Diflubenzuron, já é um produto utilizado em
agricultura há quase 40 anos, sendo utilizado na cultura do milho, soja,
fumo, maçã, pera, etc., além de uso na silvicultura e piscicultura.
Pelo fato do BPU passar incólume pelo trato digestivo (mais de 85%) dos
mamíferos, o produto é agregado como suplemento ao sal fornecido ao
gado leiteiro para controle da mosca do chifre nas fezes (mosca
hematófaga, Haematobia irritans). Há mais de vinte anos se usa o
produto e não existem evidencias da presença do produto no leito
consumido pela população.
Portanto, já estamos em contato com o produto há muito tempo, e nem nos
demos conta, pois não existem evidencias (comprovada por bons
trabalhos científicos) de seus problemas à saúde humana, quando
aplicado dentre das boas práticas agronômicas e de segurança.
Com relação aos relatos de incômodos como alergias, dor de cabeça e
coceiras durante sua aplicação, deve-se informar que o produto está
sendo utilizado no Brasil todo, e não são relatados casos com
frequência tal que chame a atenção. Casos particulares podem ocorrer,
mas dentro de uma normalidade considerada esperada, e devem ser
tratados de maneira conveniente, afinal existem casos normais de
alergia ao consumo de ovos, camarões e chocolate.
Cada vez fico mais convencido que a era da internet é a era da
desinformação, pois caso não se tome cuidados na busca de boas fontes,
ficamos com toda certeza, desinformados, devido aos “pescadores de água
turva” soltos na grande rede.
Constantemente somos questionados oficialmente pelo Ministério Público,
e estamos acostumados a este contato, pois na rotina de trabalho
respondemos a dezenas de indagações do MP oriundos de denuncias das
mais diferentes origens.
São apresentados os processos e importância do uso da substâncias no
controle da dengue, além de evidencias convincentes originárias de
fontes confiáveis, e isto tem sido suficientes para um entendimento
racional da questão, pois são informações oficiais oriundas de órgãos
reconhecidos.
Paulo Cesar da Silva
Sanitarista
Programa Nacional de Controle da Dengue
Ministério da Saúde